terça-feira, 13 de junho de 2017

hoje fiz algo arriscadíssimo: li em voz alta e em público meu poema preferido do fernando pessoa (e este é do alberto caeiro) e trechos do cântico dos cânticos — atribuído a salomão — na tradução da fiama .

me diverti tanto.

cada dia mais entendo que é a parte solitária da vida que nos toca num poema, mas através do grande ser vivo em comum que existe, que é o comum da linguagem verbal, a linguagem do verbo como encaixes do que vai vibrar pra um ou outro.


acho impressionante quando estou em cerimônias de ayahauasca e não entendo nada do que o xamã canta na língua dos shipibo ou dos huni kuin e de repente alguém fala uma palavra numa língua que eu entendo. a palavra aparece sempre como uma chave de fenda, um martelo, uma pinça. a palavra muda tudo.

ando a cada dia mais atenta às vibrações que sinto no meu corpo enquanto convivo com as pessoas, elas permitem com que eu conviva sem tanto medo dos outros. e essa coisa de estar em público trazer o ressoar das moléculas num em comum — enquanto lia o caeiro sentia a alegria de haver palavra, quando li o cântico a alegria de que a palavra possa ultrapassar a si própria, a palavra-transe, a palavra-eros.

quando lemos um poema toda a linguagem de uma vez atravessa este corpo-espaço, através dos afetos sensações rumores jogos lógicas o nonsense. o poema projétil — o poema pedra.

se toda alegria é compartilhada dar a voz é um lance muito louco, a voz de um poema imenso ilumina a garganta e — durante esta travessia — abre os canais todos.

fica tudo aceso. o poema é uma tomada, afinal.

Um comentário:

josé luís disse...

e que haja sempre fichas... ;)

 

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